Nós no singular
O sol brilha. O calor aperta. A esplanada fervilha. A mesa escolhe-se. As imperiais pedem-se. Os demais chegam. Eu faço sinal. Ela senta-se. Apresentações fazem-se. Olhares trocam-se. A conversa circunstancia-se. O à-vontade impera. Sorrisos esboçam-se. Química gera-se. Um futuro adivinha-se.
O tempo passa.
Um número pede-se. Mensagens trocam-se. Saídas combinam-se. Um decisivo copo toma-se. Janelas na alma abrem-se. Vontades professam-se. Interesse define-se. A noção perde-se. Horas tardam. Um regresso a casa impossibilita-se. Uma dormida oferece-se. Uma cama partilha-se. Nervos afloram-se. Desejos prevalecem. Um beijo dá-se. Amor faz-se. Um namoro nasce.
O tempo passa.
Rotina aparece. Novidade perde-se. Monotonia instala-se. Cansaço prepondera. Problemas surgem. Tensão aumenta. Discussões estalam. Pazes fazem-se. Um esforço toma-se. Nada se resolve. Problemas repetem-se. Soluções faltam. A postura de casal muda. A felicidade esmorece. O amor perde cor. O afastamento ganha forma. O ciclo recorre. O senso transvia-se. A lógica perverte-se. A razão naufraga. O descontrolo rebenta. O erro comete-se.
O tempo passa.
Dúvida emana. Desconfiança manifesta-se. Haveres vasculham-se. Privacidade viola-se. Segredos descobrem-se. A realidade dói. As mentiras sentem-se na pele. A agonia afoga. A descrença chora-se. A desilusão consome. Os pilares desabam. As pontes queimam-se. O que sobrava apodrece.
O tempo passa.
A porta abre-se. Eu entro. A ausência do teu olhar desdenha-me. O silêncio amarga. A iniciativa toma-se. Nós falamos. Palavras ferem. Verdades dizem-se. Lágrimas correm. A decisão toma-se. O pânico instala-se. O arrependimento corrói. O remorso estropia. Desculpas pedem-se. Desculpas não chegam. Amor não chega. Já nada chega. Esperanças esfumam-se. Sonhos morrem. O coração aperta. O ar encurta-se. As paredes fecham-se. A vida perde o sentido. O fim chega.
O tempo pára.